O PAPEL DA TEOLOGIA NA VIDA

Imagem da internet

Portanto, irmãos, pelas misericórdias de Deus, peço que ofereçam o seu corpo como sacrifício vivo, santo e agradável a Deus. Este é o culto racional de vocês. E não vivam conforme os padrões deste mundo, mas deixem que Deus os transforme pela renovação da mente, para que possam experimentar qual é a boa, agradável e perfeita vontade de Deus (Rm 12.1–2).

Definição de teologia

A palavra “teologia” parece ter sido incorporada à linguagem cristã nos séculos IV e V. Referia-se à genuína compreensão das Escrituras. Contudo, o emprego estava restrito ao conhecimento a respeito da pessoa de Deus. A partir de “Theologia christiana”, obra de Abelardo (1079-1142), passou a designar um corpo de doutrina (MAIA 2007).[1]

A palavra teologia compartilha de um sufixo –logia, como ocorre na designação de muitas disciplinas e ciências, tais como biologia, fisiologia e antropologia. O sufixo vem da palavra grega logos, que achamos no começo do evangelho de João: “No princípio era a Palavra, e a Palavra estava com Deus, e a Palavra era Deus” (Jo 1.1). O vocábulo grego logos significa “palavra”, ou “ideia”, ou, como um filósofo a traduziu, “lógica” (é também desta palavra que obtemos a nossa palavra lógica). Portanto, quando estudamos biologia, estamos considerando a palavra ou a lógica da vida. Antropologia é a palavra ou a lógica sobre os humanos, sendo antrōpos a palavra grega que significa homem. A primeira parte da palavra teologia vem do vocábulo grego theos, que significa “deus”. Portanto, a teologia é a palavra ou a lógica sobre Deus mesmo.[2]

Talvez você não se importe tanto com o termo “teologia” ou pense que você nada tem a ver com isso. No entanto, todos somos teólogos pois enxergamos e interagimos com Deus, o homem e o mundo através de vários pressupostos lógicos, éticos, filosóficos e principalmente teológicos.

O que é teologia bíblica e porque estudar essa disciplina é essencial para a vida

          Teologia bíblica é primeiramente o conhecimento de Deus por meio dos autores bíblicos em seus contextos sociocultural e teológico. Em distinção a teologia sistemática (ou dogmática) que por muitas vezes faz suas reflexões através de pressuposto externos como a filosofia, antropologia ou história, na teologia bíblica o alvo do estudo é compreender o texto dentro do seu contexto (histórico, social, linguístico, cultural etc.) e seu significado “autoritativo” dentro da história da redenção.[3]

          Muitos crentes dos nossos tempos estão seguindo o curso dessa era e sendo moldados conforme os padrões que divergem dos padrões do Reino de Deus. Interpretamos a vida conforme o modelo de nossa cultura. Em resposta nos distanciamos cada vez mais da promessa: viver a “boa, perfeita e agradável vontade divina”.

          Em seu livro; “A pirâmide da Sabedoria”, Brett McCracken compara o modelo estadunidenses de pirâmide alimentar[4] para falar sobre o que importa de verdade nessa vida para ter uma vida de sabedoria. Ele aponta o mau uso da tecnologia e o excesso de informação como os vilões de uma vida sábia. Em um mundo globalizado e pulsante digitalmente, ficamos eufóricos e atordoados, é como se, a cada vez que desbloqueamos nosso celular, ou ligamos a TV, ou abrimos a nossa caixa de e-mail, um feed, uma nova informação ou notícia explodisse perto de nós como uma granada de estímulos fragmentados e nocivos.

          Desorientados nesse mundo, somos conduzidos de um lado por outro por qualquer vento de doutrina (ou moda, ideologia, causa ou hashtags) como crianças que não são maduras para viver e não podem se proteger pois são fracas e infantis (Ef 4.14). Fundamentar nossa vida na Palavra de Deus não pode ser uma alternativa, mas uma prioridade.

Se a Bíblia é menos do que as palavras pessoais de Deus para nós, então, tratá-la como o fundamento da sabedoria faz pouco sentido. Se for apenas uma coleção antiga de textos sagrados criados por humanos para propagar uma religião em particular, a Bíblia teria pouca importância. Mas ela não é apenas um livro. São as próprias palavras de Deus para nós. Portanto, quando lemos a Bíblia, estamos nos encontrando com o próprio Deus. [.] A ligação inseparável entre a palavra de Deus e o próprio Deus significa que, se amamos a Deus, amaremos a sua palavra.[5]

          Conhecer o que a Bíblia diz é essencial para a vida, porque nossa história se conecta a grande história de Deus e seu povo. Não estudamos as histórias bíblica como se isso não tivesse relevância para o comum, o ordinário. E justamente porque essa Palavra de Deus é poderosa, precisamos nos encontrar com ela nesse lugar chamado Bíblia. Esse livro é um portal para o eterno, assim como a porta do guarda-roupa da história de Nárnia leva pessoas para um mundo novo onde Aslan é Rei, a bíblia nos leva para o Reino Deus.

Preparados para responder a todos que pedem razão da esperança

“santifiquem a Cristo, como Senhor, no seu coração, estando sempre preparados para responder a todo aquele que pedir razão da esperança que vocês têm (1Pe 3.15).

          A esperança do cristão é o Evangelho, estar preparado para dar razão da nossa fé exigirá de nós, mais do que boa vontade, mas capacidade e habilidade de fazê-lo. Estudar teologia bíblica para nós significa ser transformados no entendimento e saturados pela palavra de Deus, é sair do raso e ir para as águas profundas deste vasto oceano.

          Nosso coração e mente buscam a verdade, fomos criados para isso, “bondade, verdade e beleza”; obviamente antes que isso se torne vida para nós e para os nossos ouvintes, precisamos recepcionar o Evangelho em nosso coração para que Ele (O Evangelho) irrompa com o seu poder em nós de dentro para fora. SPROUL (2016) argumenta:

Há muitas coisas que aceitamos com nossa mente, mas que nunca alcançam a dimensão mais profunda do nosso coração. Portanto, o que professamos compreender com nossa mente não é o que determina como vivemos; o que determina nossa vida é o que penetra nosso coração – o que chamamos de valores ou crenças centrais.[6]

          Sproul comentando 1Pedro 3.15 não vai contra a lógica do autor bíblico, pelo contrário, enfatiza como “mente e coração” precisam ser priorizados quando se trata do nosso trabalho apologético.

a verdade de Deus não consegue chegar ao coração se, antes, ela não for processada pela mente. Nosso coração não pode aceitar o que a mente considera ininteligível. É importante fazer essa distinção, pois, se divorciarmos o coração da mente e tentarmos alcançar o coração evitando a mente, o que nos resta é um emocionalismo cego sem conteúdo válido.[7]

          Nosso país está cansado de tantos “evangélicos” vazios de Evangelho, que mal conhecem as Escrituras Sagradas, mas sempre sabem o nome das estrelas das novelas, o enredo dos últimos filmes de super-heróis, ou séries premiadas, ou qual é a última polêmica que saiu na internet e qual clube de futebol irá fazer sua grande contratação esse ano. Evangélicos cheios do mundo, e vazios de Deus, atolados de informações inúteis, mas rasos como poços secos e enlameados.

Teologia, doutrina e devoção

 Quando eu estava de viagem, rumo à Macedônia, pedi a você que ainda permanecesse em Éfeso para admoestar certas pessoas, a fim de que não ensinem outra doutrina, nem se ocupem com fábulas e genealogias sem fim. Essas coisas mais promovem discussões do que o serviço de Deus, na fé (1Tm 1.3-4)

O pastor paulista, Angelo Bazzo ao falar da importância da teologia e doutrina para a vida comenta: “A doutrina que você abraça fundamenta a maneira como você vive, ou seja, a verdade bíblica que você abraça ou a maneira como encara a Bíblia está formando a maneira como você vive”.[8]

O objetivo principal de conhecer as Escrituras Sagradas é porque ela nos possibilita um encontro com Deus. Jesus questiona alguns líderes religiosos que ao mesmo tempo em que estavam diante da porta, nunca entravam por ela, Ele diz: “Vocês examinam as Escrituras, porque julgam ter nelas a vida eterna, e são elas mesmas que testificam de mim.  Contudo, vocês não querem vir a mim para ter vida (Jo 5.39-40). Bazzocontinua seu argumento:

O cerne do divórcio entre doutrina e devoção tem a ver com a nossa tendência de querer aprender conceitos para poder dominar assuntos e, assim, estar no controle das situações da vida. Mas entenda! A última coisa que Deus quer é que você seja alguém que domina, porque Seu desejo é que você seja dominado por Ele.[9]

          Quando nos aprofundamos no estudo das Escrituras, não podemos ser presunçosos e achar que quanto mais conhecimento, mais domínio sobre a teologia, e que isso nos engrandecerá, ou nos fará melhores ou superiores a outros. Se alguém estudou a Bíblia para objetivos escusos como estes, você não foi mais longe do que os líderes religiosos dos tempos de Jesus.

          Estudamos a Bíblia, conhecemos a sua história para que essa doutrina entre dentro de nós e case com a nossa devoção a Deus. “Ser dominado” por Deus significa ser amansado por nosso Senhor, porque sem Ele e sua doutrina, somos selvagens e sem destino, nosso coração funciona como uma bússola quebrada, mas Deus por meio da sua Palavra e Espírito, não apenas conserta o nosso coração, mas também nos orienta de maneira adequada para o nosso propósito supremo: Deus e sua glória.

Conclusão:

          Eu poderia destacar a frase de Sto. Agostinho, teólogo e pai da Igreja[10]: “Creio para conhecer, e conheço para crer”. Esta frase é emblemática por sua simplicidade e profundidade. Obviamente pouquíssimas pessoas chegam a fé em Cristo por meio de um exame rigoroso e sistemático das Escrituras, muitos de nós fomos despertados por palavras, discurso, narrativas, poesias, salmos, profecias recortadas ou expostas dentro de pequenos blocos, tempos ou situações. É incrível como Deus executa o seu chamado eficaz.

          Cremos na Palavra de Deus, de início tateamos esse infinito eterno chamado Deus e seu Reino, compramos ou ganhamos uma Bíblia e alguém poderia nos questionar no início, “Entende o que lês?”, responderíamos “Não muito, mas creio”. Engatinhando na jornada cristã, somos levados às histórias:  Adão e Eva no Jardin, Caim e Abel, Noé e o Diluvio, Abrão, Isaque e Jacó, Moises e povo de Israel, Josué, os Juízes, os Reis, os profetas, os exílios, os Salmos, as poesias, a chegada do Messias, os discípulos se tornando apóstolos, a Igreja nascendo e crescendo, “criação, queda, redenção e consumação”. Que linda história, que grande revelação! Creio para compreender, mas quando compreendo, amo, fico maravilhado, espantado, e por fim cada vez mais e mais crente nas Escrituras e em nosso Senhor Jesus.


[1]  Fundamentos da teologia reformada, Hermisten Maia, 2007. Editora Mundo Cristão (p. 09)

[2] R. C. Sproul, Somos Todos Teólogos: Uma Introdução à Teologia Sistemática, org. Tiago J. Santos Filho, trad. Francisco Wellington Ferreira, Primeira Edição. (São José dos Campos, SP: Editora FIEL, 2017), 16–17.

[3] A teologia bíblica lida com o texto bíblico no cenário histórico e literário, destacando o significado do texto para o público originário. Os teólogos bíblicos procuram interpretar passagens ou livros individuais dentro da estrutura maior da história da redenção. As teologias bíblicas geralmente tratam dos principais tópicos teológicos como criação, queda, redenção e glorificação.

Os teólogos bíblicos se concentram na relação entre o Antigo e Novo Testamentos. Algumas abordagens interpretativas mais comuns usadas na construção de uma teologia que perpassam todo o cânon são alegoria, tipologia, lei/evangelho e promessa/cumprimento. O teólogo bíblico reconhece ser a Bíblia um livro teológico (unificado) e histórico (diversificado), e a teologia bíblica saudável a ambos os aspectos seu valor.[3]

[4] Em 1992, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) introduziu a Pirâmide Alimentar, dividindo os alimentos em seis grupos, depois esse programa foi evoluindo 2005, 2011 e 2020

[5] Brett McCracken, p. 89, A Pirâmide da Sabedoria, Thomas Nelson, Rio De Janeiro, 2023

[6] R. C. Sproul, Estudos Bíblicos Expositivos em 1 e 2Pedro, trad. Markus Hediger, 1‍a edição. (São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2016), 105.

[7] R. C. Sproul, Estudos Bíblicos Expositivos em 1 e 2Pedro, trad. Markus Hediger, 1‍a edição. (São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2016), 106.

[8] Bazzo, p. 28, Doutrina e Devoção, Charpentier, 2020, Brasília, DF.

[9] Bazzo, p. 31, Doutrina e Devoção, Charpentier, 2020, Brasília, DF.

[10] Santo Agostinho de Hipona (354-430) foi um dos maiores pensadores da história do Cristianismo, deixando um legado duradouro através de sua vida exemplar e ministério frutífero

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *