AS BEM-AVENTURANÇAS E A VIDA NO REINO DE DEUS

Vendo Jesus as multidões, subiu ao monte, e, como se assentasse, aproximaram-se os seus discípulos; e ele passou a ensiná-los, dizendo: Bem-aventurados os humildes de espírito, porque deles é o reino dos céus. Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados. Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra. Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão fartos. Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. Bem-aventurados os limpos de coração, porque verão a Deus. Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus. Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus. Bem-aventurados sois quando, por minha causa, vos injuriarem, e vos perseguirem, e, mentindo, disserem todo mal contra vós. Regozijai-vos e exultai, porque é grande o vosso galardão nos céus; pois assim perseguiram aos profetas que viveram antes de vós. (Mateus 5.1-12)

Ainda estamos falando sobre epifania. Deus está conosco, Ele é o Emanuel (Mt 1.23), o Messias, rei de Israel e do mundo, estabelecendo o seu reinado e convocando os homens a participar do grande plano divino de redenção de todas as coisas por meio de Cristo (At 3.21).

Assim como Moisés, legislador de Israel, Jesus também sobe uma montanha e entrega o ensino do reino a seus discípulos. O novo Israel de Deus, redimido, é convocado a ser na terra a nação do reino dos céus, a nova humanidade recriada a imagem e semelhança do Filho (Rm 8.29).

Dizer que o reino de Deus chegou é dizer “boas novas”, fazendo-se necessário arrependimento e abandono de toda autonomia e depravação para abraçar o Evangelho de Jesus como Senhor e ser salvo. Sendo Jesus o Rei Salvador, estabelece um reinado, ficando explícito que aqueles que desejam o seu favor se submetam ao soberano e poderoso governo de Cristo, demonstrando em gratidão uma nova maneira de ser e viver essa nova condição (Os 14.1-2).

Um paradoxo: contradição ao mundo

No monte, ouvindo o sermão, é o lugar onde devemos nos assentar sempre que pudermos. Este sermão não é aleatório, Jesus pretendia imprimir nos seus discípulos a imagem do que é a vida no Reino e o papel dos discípulos como representantes dos Céus na terra. Por outro lado, a humanidade caída é o oposto dos bem-aventurados. Quem lê os evangelhos desavisadamente, pode, com equívoco, compreender este texto como uma piada, afinal de contas que valor há em ser pobre, manso, humilde, perseguido e outras aparentes fraquezas?

Entretanto, é assim que Cristo diz que deve ser; o bem-aventurado é aquele que vive sob a expectativa do reino de Deus e é governado pelo Senhor deste reino. A promessa é certa, a condição presente não afeta o que está reservado no futuro, o temporal não pode ser comparado com o eterno, sendo assim, a condição de sofrimento, perseguição e qualquer outro tipo de adversidade é apenas um momento que antecede o grande ato de Deus na história da redenção. Na segunda vinda de Cristo, toda a história será consumada e o plano de Deus completamente revelado a todas as pessoas e seres do universo (1Ts 4.16).

Bem-aventurado

Outro dia uma pessoa me disse que é impossível ser plenamente feliz neste mundo, que o máximo que podemos experimentar antes da vinda de Cristo são aquelas alegrias momentâneas, um curto período de euforia, nada que poderíamos chamar de duradouro. Concordo em partes e compreendo que falar sobre felicidade é um assunto que intriga os seres humanos há milhares de anos.

Mas, preste atenção nas bem-aventuranças: Cristo não está prometendo algo temporal, não está falando de um momento, Ele está apontando o nosso coração para o seu Reino eterno, ou seja, felicidade na Bíblia me parece mais com propósito de vida do que com uma percepção sensorial de bem estar. Ser bem-aventurado é, sim, ser feliz tendo Deus como fonte inesgotável de júbilo e satisfação (Sl 68.3). Se Deus é o alvo da nossa felicidade somos bem-aventurados; isso não se trata de autopromoção de bem estar, mas de algo que é feito em nós e por nós, para a nossa plena alegria.

Como vocês bem sabem, o Evangelho é esta boa notícia, de como um Deus irado com o pecado envia o seu Filho amado para estabelecer o Reino e destruir todas as forças malignas, resgatando os seres humanos como herança (Sl 2.8). Desta maneira, os inimigos de Deus se tornam perdoados, inocentados e redimidos para uma nova vida no Reino. Aqueles que milagrosamente e por obra do Espirito Santo, nascem no Reino, são declarados benditos, abençoados, felizes e bem-aventurados (2Co 5.17).

Os bem-aventurados são humildes de espírito, pois perderam tudo para ganhar o Reino. Choram por causa dos seus pecados e dos seus semelhantes aguardando o dia em que o Senhor enxugará toda a lágrima. São mansos porque o Rei que os governa é também o pastor de suas vidas, amansando a ovelha que estava perdida. Também são famintos por justiça e misericordiosos, sabendo que toda a justiça pertence a Deus que os agraciou com misericórdia. Puros de coração, pacificadores e mesmo assim perseguidos por amor ao seu Senhor.

Eles estão confiantes no Reino de Deus e isso é maior do que as próprias tribulações; por causa do seu Senhor se regozijam, se alegram verdadeiramente pela fé. Esta é a vida dos bem-aventurados. Foi e é assim com aqueles que se aliançam com o Messias.

O que significa ser bem-aventurado na cultura hebraica

A palavra grega que se refere à expressão bem-aventura no texto de Mateus é “μακάριος ou makarios” que tem o sentido de “abençoado ou bendito”. No entanto, Jesus provavelmente ministrou o sermão em hebraico, língua do povo judeu de sua época, e a raiz da expressão poderia ser “אַשְׁרֵי ou asrê” que na Bíblia tem significado semelhante, porém poderíamos fazer um acréscimo à sua compreensão ao comparar com outros textos onde essa mesma palavra é usada (Jó 5.17, Sl 1.1, 32.1, 34.8, 40.4, 41.1. 65.4. 128.1). Neste caso, o sentido de ser bem-aventurado é semelhante ao homem que se encontra em uma jornada de fé, obediência e procedência diante de Deus e da sua lei. A felicidade não é apenas um estado de espírito, mas também um caminho de discipulado e encontro com o Deus que compartilha quem Ele é o que Ele faz.

Conclusão

Nossa sociedade tem vendido modelos de sucesso midiáticos, padrões de vida que contradizem o que Jesus ensina em seu sermão e semelhantemente, muitas igrejas têm abraçado as facilidades e prazeres momentâneos em detrimento daquilo que é eterno. O padrão bíblico, o exemplo de piedade dos grandes homens de Deus que seguiram Jesus no passado, está sendo deixado de lado em troca dos valores dos pastores estrelas, dos influenciadores digitais, dos coachs e dos pregadores da prosperidade.

Não podemos continuar da mesma forma ao escutar novamente as palavras ditas por Jesus. Mais uma vez, nós que experimentamos a sua presença e escutamos a sua voz pelas Escrituras Sagradas (epifania), devemos ser pobres de espírito, perder tudo para alcançar o Reino de Deus e o Senhor deste reino, segui-lo até que a nossa vida seja uma afronta aos poderes deste mundo, até que a nossa maneira de ser e viver aqui sejam totalmente incompatível com a cultura das trevas.

Essa postura de submissão somente a Jesus poderá nos causar sérios danos, sofrimentos, lamentos, perseguições, injúrias e quem sabe a morte. No entanto, o que vale mais para você: ganhar o mundo e perder a sua alma, ou ser achado fiel àquele que nunca nos abandou (Mt 16.26)

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